terça-feira, 2 de janeiro de 2007

Relato do piloto Geraldo Nobre: Uma Asa Sobre Cuzco (1989)



Piloto: Geraldo Nobre (piloto de asa, Rio de Janeiro)
Este foi um dos 5 relatos que o piloto Geraldo Nobre (dinossauro do voo com mais de 30 anos de esporte) enviou para concorrer à promoção do Spot com anuidade




UMA ASA SOBRE CUZCO

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Com GERALDO NOBRE

19.000 pés já era uma altitude mais do que suficiente para vislumbrar toda a pampa, o vale sagrado dos Incas e atrás de mim a cidade. Procurando dominar a emoção, aproei sudeste na bússola, abandonei a térmica e parti rumo a Cuzco. A emoção era quase incontrolável. Os efeitos da altitude não se faziam sentir. Os sacrifícios haviam sido recompensados, conseguira alcançar a meta, Cuzco estava sob meus pés.

A motivação para esta aventura sobre Cuzco veio através de um convite da Comission Nacional de Vuelo Libre do Peru, feito pelos pilotos Kurt Meinel e Josué Bustamante. Os amigos solicitavam junto à Popstar Turismo minha ida a sua terra natal para juntos explorarmos a potencialidade de vôo local, incentivar a prática de nosso esporte e, quem sabe, prepararmos a base para um futuro evento internacional neste berço de nossa civilização sul-americana.





Com o significativo apoio da AEROPERÚ, das cozinas SURGE, da COMISSION NACIONAL DE VUELO LIBRE DO PERU e da POPSTAR Turismo, desembarcamos em Lima na noite de 23 de outubro de 1989, trazendo na bagagem uma asa delta INTERCEPTOR da ALBATROSS. Os amigos lá estavam a minha espera e, mais do que isso, Kurt era comandante no vôo que me levou do Rio de Janeiro a Lima.

Recém chegado e instalado, tratamos logo de fazer um roteiro para a nossa curta estada de oito dias no Peru:

- 2 dias para conhecer Lima e voarmos na Costa Verde;

- 3 dias para irmos a Callejón de Huaylas, às cidades de Huaraz e Caraz e voarmos nas Cordilleras Blanca e Negra, no Departamento de Ancash;

- 3 dias para irmos ao Departamento de Cuzco, voar na pampa, no vale sagrado dos Incas e, quem sabe, na cidade de Cuzco.

Pronto, tínhamos um pequeno roteiro. Não colocamos todos os locais onde se pode voar no país como, Cumbemayo em Cajamarca, Nazca em Ica, Majes em Arequipa, Mantaro em Junin e Colan em Piura, mas, para este curto espaço de tempo colocamos o que nos parecia os principais locais de vôo e turismo local.

Segunda-feira, 24/10, amanheceu com céu claro e com uma névoa que descobrimos ser uma característica da cidade de Lima, devido às correntes gélidas da costa do Pacífico. Asas sobre o Toyota do Josué‚ e partimos a encontrar o Kurt em San Isidro, bairro de Lima onde esta situado o parque Gandhi, local de decolagem; um jardim florido situado a 80 metros sobre a praia, aliás, como toda a cidade de Lima.

O vôo é tranqüilo. Temos uma encosta de aproximadamente 5 km de extensão e 80 m de altura entre a praia e a cidade, com vento de frente, sempre constante, 10 a 15 milhas, permitindo um ganho de altura de 100 a 200 metros sobre a decolagem e possibilitando-nos admirar todas as ruas e construções da cidade. Nós três decolamos e ficamos em torno de 2 horas a passear por um local incomum ao turista, 150 metros sobre costa de Lima indo até‚ Miraflores e retornando à Avenida Brasil, pousando na própria decolagem ou no farol de Miraflores e tornando a decolar. Podemos chamá-lo de vôo cartão postal, pois é exatamente a impressão que se tem durante todo o vôo, várias vistas dignas de comporem um álbum de cartões postais de Lima. Podemos, também, classificá-lo para os praticantes de Vôo Livre como um local fácil e seguro de voar; decolagem e pouso propícios para os iniciantes no esporte ou para vôos duplos, com correntes orográficas constantes durante todo o dia e sem atividade térmica. Enfim, o paraíso para vôos de permanência.

Quarta-feira, 25/10, novo dia, início da segunda parte de nosso roteiro: viagem a Callejón de Huaylas onde temos o Parque Nacional de Huascar no limite entre a Serra e a Selva Amazônica, com sua lindíssima Cordillera Blanca, onde também estão situadas Catac, Huaraz, Carhuaz, Yungay e Caraz dentre outras vilas locais dedicadas à agricultura, ao pastoreio, ao artesanato, ao turismo de aventura (alpinismo, canoagem, vôo livre, montanhismo, esqui, etc.), além de seus sítios arqueológicos, de Huanraga, de Huahullac, de Wilkawain, de Joncopampa, de Kekepampa, de Hualcayan e de Auquispuquio.

Acompanhado de Josué‚, com nossas asas e com Rolando, nosso amigo motorista das cozinas Surge, saímos de Lima rumo ao Norte pela rodovia Pan-americana. Pela paisagem desértica da costa do Pacífico passamos por Ancón, Chancay, Huacho, Barranca até atingirmos Pativilca, vilarejo onde devemos abandonar a Costa e seguir pelos contrafortes dos Andes até a região de Serra. Penetrando por vales verdes e com montanhas só de pedra e areia vamos subindo e descobrindo os primeiros grupos e vilas de campesinos, povo humilde, simples, dedicado às atividades básicas da região: a agricultura, o pastoreio e o artesanato, porém, com uma doçura e dedicação que deveria servir-nos de exemplo. À medida que subimos a paisagem vai se transformando para apresentar-nos a magnitude e imponência da Cordilheira dos Andes. Atingimos o ponto mais alto da subida, a vila de Conococha a 4.100m. A paisagem muda radicalmente. Descortina-se a nossa frente uma pampa verdejante imensa tendo ao fundo o pico Caullaraju com seus 5.600m, nevado. É impressionante o que a natureza reservou-nos de belo neste local, algo de tirar o fôlego, algo de levar-nos a sonhar que aqui devo ter uma moradia eterna. A partir daqui o caminho‚ através da pampa, em suave descida, em direção ao vale. Ladeada pelas Cordilleras Blanca, com seus 6.000 m de altitude em média à direita, e Negra, com seus 5.000 m à esquerda, a estrada avança por sobre o vale e passamos por Catac, Huaraz, Carhuaz, etc..., cidades da região. Admirei a dedicação dos campesinos, em seus trajes típicos, no trabalho quase artesanal de suas terras. As encostas formam verdadeiros mosaicos de traços e cores. É o resultado de seu suor e a fonte de seu sustento.

Chegamos a Yungay, cidade há poucos anos soterrada por uma avalanche vinda do pico mais famoso do vale, o imponente Huascaran. São 15h, almoçamos e já é tarde para voarmos, mas, mesmo assim, vamos tentar a subida. É através de uma pequena estrada de pedras, caminho de descida de um vilarejo dedicado ao cultivo de flores para exportação, que se vai ao ponto de decolagem. É um trajeto duro, impossível para um carro de passeio, necessitamos de um Jipe. Após algumas tentativas, desistimos.

- "Amanhã será um novo dia e conseguiremos outro carro e teremos mais tempo", com este pensamento, alguma frustração e o cansaço das 8h de viagem necessárias para chegarmos, fomos nos instalar em Caraz.

Caraz, 2.100 metros de altitude, cidade bem marcante no vale, cidade típica do local, cidade exportadora de flores, cidade orgulho de seus habitantes, principalmente pelo clima diverso do restante do vale, sempre bom.

Instalados no Hotel Chavin saímos a procurar Murad, um francês descendente de árabes, amigo de Josué‚ residente há algum tempo em Caraz e um fã ardoroso da cidade, do vale e de seu povo e como era conhecido, o gringo dono do Djurjura, "Café Restaurante Internacional de Caraz". Não tão imponente quanto o nome, mas aconchegante e onde junto com sua esposa servem amavelmente a melhor comida da cidade. Ele foi nosso anfitrião e providenciou tudo para que no dia seguinte pudéssemos efetuar nosso vôo de reconhecimento.

Quinta-feira, 26/10, outro dia desponta. Cedo nosso anfitrião chega com o almejado Jipe e partimos para a Serra. Percalços na subida: pedras no caminho, entradas erradas, atoleiro e quase rolamos a encosta, mas, sãos e salvos chegamos ao topo. Não na decolagem, no ponto da estrada mais perto dela. Faltam ainda uns 100 metros morro acima com todo o equipamento: asas, cintos, pára-quedas, instrumentos e etc. Os campesinos nos são solícitos e socorrem-nos ajudando na estrada e no transporte de todo o material. Apresentam-nos a sua face humilde e simples, pura e amiga, solícita, capaz de comover-nos. Sou-lhes grato por mais esta emoção. Enfim, estamos na decolagem, o vale descortina-se nossa frente, todo cultivado e com a cidade de Caraz como fundo, ladeado pelas nossas já íntimas Blanca e Negra. Asa montada, todo o aparato pronto, 25 milhas de vento de frente! Um pouco forte, mas perfeitamente decolável. Com a ajuda de Murad, de Rolando e dos Campesinos nos cabos das asas, estamos na encosta de relva escolhida para decolagem. 1, 2, 3, Já e, tanto Josué‚ como eu, somos literalmente soltos no espaço. Decolamos de aproximadamente 700 m acima do nível do vale e logo estamos a 300 m sobre a decolagem, quase parados, flutuando sobre o vale, entre as cordilheiras. O vento sempre constante e paralelo a encosta penetrava no vale produzindo ascendentes nos seus contrafortes. O teto de nuvens não muito alto escondia os picos mais elevados. Uma formação de chuva no fundo do vale, atrás da decolagem, dizia-nos que não valia à pena tentar voar seguindo o vale, portanto, ficamos a contemplar o mundo abaixo de nós por aproximadamente 1 hora, ao fim da qual, com a proximidade das nuvens carregadas, partimos para o pouso. Um pouso na vertical, como um elevador, o vento tinha aumentado mais umas 10 milhas, devido à vinda da chuva. Um pouco de turbulência, mas tudo sob controle. Estamos no chão, num sítio chamado Fundo Del Carmem, na entrada de Caraz, a 8 km da decolagem. Satisfeitos, felizes e agora molhados, pois a chuva chegara, desmontamos as asas e pouco depois chega nosso resgate. Murad e Rolando desceram com o Jipe sem problemas e agora nos resgatavam. Um bom jantar no Djurjura, estórias de vôo, contos da região, troca de experiências de vida e sem perceber havíamos chegado ao fim de mais um dia.

Despedidas, agradecimentos, promessas de retorno e viagem de volta a Lima pelos mesmos vales, pela pampa, descendo a serra, através da costa desértica e provando o famoso cebiche, este foi o nosso quinto dia no Peru, Sexta-feira, 27/10.

Sábado, 28/10, 06h00min da manhã, aeroporto Jorge Chavez, Lima, acompanhado mais uma vez pelo amigo e sagaz companheiro de viagem, Josué, estamos embarcando com a cortesia da AEROPERU para a terceira e mais importante parte de nossa aventura, onde me parece ser a região mais famosa em termos turísticos, CUZCO.

Tudo que ouvimos falar sobre Cuzco é de imediato comprovado. Situada a 3.100 metros s.n.m., na parte Ocidental da Cordilheira dos Andes, sede do Império Quechua ou dos Incas, como queiram, a cidade exala de imediato uma aura de misticismo da época Incaica, através de sua arquitetura quase toda moldada em pedra e barro, através de seus aldeões em trajes típicos a percorrê-la, através de suas danças folclóricas, através de suas ruínas e museus e ainda mesclada com algo da colonização espanhola.

Já no aeroporto a aura de Cuzco nos envolve e domina. Você se sente diferente, emocionado e encantado com a região.

Justo Torres, representante local das cozinhas SURGE, é quem nos recebe e faz as honras enquanto de nossa estada na cidade. Atencioso e extremamente calmo, ele nos acomoda no Hotel Tambo, providencia a caminhonete para transporte das asas, leva-nos a casa de Josué López e de Nélio Mujica, amigos locais, entusiastas de nosso esporte, e que são nossa companhia, apoio e ajuda durante todo o tempo em que aí estivermos.

São 11h30min estamos prontos, com todo o material e pessoal necessário e relativamente aclimatados com a altitude, pois havíamos feito um estágio de três dias em Caraz, entre 2.000 e 3.000 m, tomamos o famoso chá de coca, obrigatório para se tentar evitar o sorote (enjôo das alturas) e, dispostos a conhecer o que se pensava do vôo sobre a pampa e sobre o vale sagrado dos Incas. Partimos em direção Norte, rumo a Chincheiros, um vilarejo campesino situado na pampa, conhecido por seu mercado indígena de trocas, vizinho a decolagem. A natureza reservara-me outra surpresa e emoção: a pampa. Era algo mais belo do que podia ter imaginado, aquele mosaico de traços e cores visto anteriormente era aqui a paisagem dominante e a perder-se de vista em todas as direções. Para nós voadores, um verdadeiro mar de pousos perfeitos, ou melhor, um só pouso, ou talvez, tudo é pouso, mais do que isso, além do imenso pouso a beleza bucólica da pampa com suas pequenas represas e ovelhas, gado, burricos a pastar, criando uma imagem digna de uma tela. O morro da decolagem, situado a aproximadamente 45km de Cuzco, pode ser descrito como uma calosidade na pampa, com a mesma paisagem, tendo 200m de desnível pela parte posterior e uns 550m pela face escolhida como decolagem. Pela subida suave e gramada se atinge o cume e pode-se mirar ao redor toda a imensidão desta pampa, as represas e, de quebra, como uma fenda ao nosso lado, o vale sagrado dos Incas, tendo na outra encosta seus picos nevados. Mais uma vez os campesinos estão presentes, pois antes da subida passamos em Collanas, povoado ao pé da decolagem, e solicitamos a comunidade seu apoio e ajuda para chegarmos ao topo. Logo a pick-up estava com uns 10 homens dispostos a nos acompanhar. A área para montarmos as asas é praticamente todo o morro. O vento faz-se sentir entre 10 e 25 milhas durante uma rajada. As características do terreno, o sol quente, o ciclo de rajadas nos dá a certeza de térmicas, talvez não tão intensas quanto desejaríamos, pois se avizinha um imenso cirrus vindo de noroeste. Não há qualquer problema, faremos um vôo de reconhecimento, deixando para amanhã qualquer tentativa de cross-country (vôo de distância).

Todos a postos, asas montadas, roupas térmicas, luvas, capacete, óculos protetores, equipamentos aferidos, vento de noroeste 20 milhas, altitude 12.530 pés, 14h50min e novamente alçamos vôo. Uma ascendente suave e forte nos coloca a 1.000 pés sobre a decolagem. De início um pouco de turbulência, mas logo se torna um vôo liso e panorâmico sobre a região. Um gavião junta-se a nós, ora seguindo-me, ora acompanhando Josué. Agora somos três que estão a planar. Estendemos nosso passeio ao lado e vamos até‚ a borda do vale sagrado, sobre Urabamba; voltamos, ganhamos mais altura e vamos a frente até‚ Moras e por sobre as ruínas de Moray; voltamos novamente, retomamos a altura e ficamos neste êxtase, variando entre 11.500 e 13.500 pés, pois o cirrus ali se instalara não permitindo alturas maiores, por aproximadamente 2 horas, após o que partimos ao pouso. Josué penetra no vale e vai pousar em Urabamba. Eu desço em círculos, decidido a pousar suavemente no centro do pequeno povoado, como forma de agradecimento a tanta amabilidade deste povo.  Uma correria, uma festa, uma novidade. Todas as crianças correm ao meu encalço; as senhoras, mais recatadas, se acercam; os homens, mais arredios, observam-me. A felicidade deles pelo evento e a minha pelo vôo esta estampada em nossos rostos. Sou brindado com uma chicha, cerveja feita no campo à base de maiz. Meus amigos lá já estavam e ajudam a desmontar e arrumar todo o material rapidamente, pois já são mais de 17h00min e ainda devemos recuperar Josué no vale. Despedimo-nos dos campesinos e descemos rumo a Urabamba. Achamos Josué‚ dentro de um casebre rústico, jantando com uma pequena família local. A recepção tinha sido tão calorosa quanto a minha. Incrível, estávamos tendo como coroamento do dia lições de humildade, de pureza de sentimentos, de cortesia e de amabilidade. O sol se pôs e nosso retorno foi de noite.

Sábado, 29/10, o dia amanhece exuberante, um azul forte e indicativo de condições mais do que perfeitas à prática do vôo livre. Era meu último dia de vôo no Peru. Eu sabia disto e tinha que marcar minha vinda aqui. Era minha última chance, não podia perdê-la, tinha que voar sobre Cuzco. Eu sabia que era perfeitamente realizável. Chega de vôos de reconhecimento local. Já estava mais aclimatado com a altitude. Devia deixar minha técnica fluir para alçar algo maior. Estava decidido: Iria pousar no aeroporto de Cuzco.

Às 10h00min estávamos todos reunidos no Hotel e prontos para partir. A decolagem deveria ser mais cedo e apressamos o passo. Chegamos na decolagem e as condições eram superiores às do dia anterior: o mesmo vento, mais sol, sem cirrus e com vários cúmulos a se formar. O teto estava alto, acima dos picos nevados, o que nos indicava algo em torno dos 6.000 metros.

- "Josué! Vamos voar sobre a pampa em direção sudeste, para Cuzco."

- "Tire uma foto."

- "Olha, vou voar naquela direção, passar aquela cordilheira e chegar a Cuzco. Procurem-me no aeroporto."

Lembro-me que Josué López e Nélio ficaram incrédulos, mas não disseram nada.

Outra vez tudo pronto e às 13h10min nova decolagem. Porém, como tudo indicava, hoje tínhamos térmicas melhores e logo achei uma imensa. Procurei caprichar e centrando ao máximo fui vendo o mundo diminuir sob mim. O morro da decolagem achatou-se no solo e em alguns minutos derivando com a térmica estava a 16.500 pés, 4.000 pés acima da decolagem, um recorde pessoal e para mim histórico. Perfeito, parti ao cross, seguindo o que me pareceu à melhor rota: rumo ao lago Piuroy, represa de Cuzco, ao pé da encosta que estava a Sul. A escolha não foi muito feliz, perdendo altura lá cheguei, encontrando uma área um pouco instável, sem ascendentes consistentes. Tinha perdido 3.000 pés e devia rapidamente escolher outra rota. Josué vendo que partira, não hesitou, mesmo com pouca altura seguiu-me. Infelizmente não achou outra ascendente em sua rota e viu-se obrigado a pousar perto de Chincheiros, na pampa. Virei a Oeste vendo uns cúmulos que se formavam e dirigi-me a eles. Perdi mais 600 pés, mas encontrei a térmica em formação. Primeira fraca e instável, pouco a pouco mais firme até‚ estabilizar-se em cerca de 500 pés por minuto de ascendência constante. Uma vez mais aquele êxtase de elevar-se numa térmica.

- "Espere, tenho que documentar isto.", pensei.

Saquei a máquina fotográfica e comecei a documentar o vôo. À medida que subia o horizonte de visão aumentava. De repente ultrapassei a altura da cordilheira, ainda distante uns 5 km, e avistei Cuzco. A emoção começava a se fazer presente e pensava:

- "Estou quase lá."

- "Falta-me pouco."

- "Controle-se."

- "E a altura?"

- "A quanto estamos?"

- "17.800 pés!"

- "Está se sentindo bem?"

- "Nenhum efeito da altitude?"

- "Espere mais um pouco."

- "Tire uma foto de Cuzco ao longe."

- "18.980 pés."

- "Está bom."

19.000 pés s.n.m. já era uma altitude mais do que suficiente para vislumbrar toda a pampa, o vale sagrado dos Incas e atrás de mim a cidade. Procurando dominar a emoção, aprumei sudeste na bússola, abandonei a térmica e parti rumo a Cuzco. A emoção era quase incontrolável. Os efeitos da altitude não se faziam sentir. Lembro-me, ainda, que me dirigi à ponta da cordilheira que separa Cuzco da pampa, que parei novamente, que encontrei nova térmica e recuperei parte da altura perdida até chegar ali. Já não importava mais, o importante era que os sacrifícios haviam sido recompensados, conseguira alcançar a meta, Cuzco estava sob meus pés. Estava sobre a cidade e dediquei alguns minutos a fotografar as ruínas de Sacsayhuaman, a praça de armas com sua catedral, o estádio e todas as cercanias da cidade. A altura em que me encontrava sobre Cuzco permitia que continuasse o vôo para qualquer direção, mas não, já era o suficiente, vamos consagrá-lo. Fiquei sobre a cidade cerca de 40 minutos, indo e vindo em todas as direções, até que por fim dirigi-me ao aeroporto para o último planeio e onde sabia que certamente o pouso seria registrado. Às 14h50min estava pousado e sabia ser o novo detentor do recorde sul americano de altitude com asa delta. O mais foi festa: o povo que acorreu para ver a novidade; os amigos que chegaram para resgatar-me e que não acreditavam ser possível; o jantar na casa de Josué López, as despedidas e, a certeza de que voltarei para novos vôos, para a festa dos campesinos e para o passeio que não fiz a Manchu Picchu.

Da viagem e de seus objetivos concluímos que o vôo livre no Peru é perfeitamente possível e com grande potencial. Lima e todas as regiões de vôo situadas na Costa apresentam condições ideais para vôos de permanência, perfeitas até mesmo aos pilotos iniciantes. Criando-se uma infra-estrutura adequada pode-se promover um evento nacional, talvez na semana de andinismo, em Caraz. E, que Cuzco ‚ imbatível pela beleza, pelas condições técnicas de vôo e pela infra-estrutura apresentada pela cidade para eventos de porte internacional, além de todo o misticismo e história que a rodeia.

Gostaria, ao final, de registrar os meus sinceros agradecimentos a POPSTAR Turismo pela intermediação da viagem, a AEROPERU pelas concessões no transporte aéreo, às Indústrias SURGE pela hospedagem e locomoção, à COMISSION NACIONAL DE VUELO LIBRE DO PERU e a todos os seus associados pelo convite, a Kurt Meinel e Josué Bustamante companheiros e amigos no esporte, a Rolando, Justo Torres e Murad decisivos no apoio a nossos vôos, a Josué López e a Nélio pela ajuda e admiração ao amigo e ao esporte e, em especial, aos campesinos por sua beleza interior. A todos vocês o meu muito obrigado e, tenham certeza que isto só foi possível pela união e motivação de todos nós.



FICHA TÉCNICA DO VÔO

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DATA: 29 de outubro de 1989.

DECOLAGEM

LOCAL: Cerro Sacro

ALTITUDE: 12.530 pés

HORA: 13h10min h

POUSO

LOCAL: Aeroporto de Cuzco

ALTITUDE: 10.200 pés

HORA: 14h50min h

CONDIÇÕES DE VÔO

VENTO: Noroeste de 10 a 20 milhas

TÉRMICAS: 300 a 500 pés por minuto

TEMPO DE VÔO: 01h40min h

ALTITUDE MÁXIMA: 18.980 pés

GANHO DE ALTURA: 6.450 pés sobre a decolagem

DISTÂNCIA VOADA: 25 km

Em 1991, voltamos a Cuzco para realizar o primeiro Evento Internacional de Cross Country no local, com pilotos de diversos países. Fizemos vôos seguindo por dentro do Vale Sagrado, vôos passando por Cuzco e seguindo por vales no meio dos Andes, tudo com apoio incondicional do Exército Peruano no resgate e no transporte aéreo até lá, pois era a época dos Tupamaros. Fomos também conhecer e tentar voar em Manchu Picchu, mas isto é uma outra estória.


segunda-feira, 1 de janeiro de 2007

Relato do piloto Geraldo Nobre: Petrópolis até Aldeia Velha



Piloto: Geraldo Nobre (piloto de asa, Rio de Janeiro)

Este foi um dos 5 relatos que o piloto Geraldo Nobre (dinossauro do voo com mais de 30 anos de esporte) enviou para concorrer à promoção do Spot com anuidade

Geraldo Nobre: De Petrópolis até Aldeia Velha!


Que vôo !!!

Que Dia diferente !!!

Primeiro, ainda na rampa, observavamos algumas formações no Tinguá e na Serra do Vulcão a uns 3.000m de altitude e a direção de sua derivada de SW.

Depois alguns cumulus sobre o Cindacta com alto desenvolvimento e formação de lenticulares em seu topo !

E na rampa, decolagem serena, suave, ventinho de frente e pouca indicação de turbulência e muito menos de que haveria desenvolvimento rápido de CB.

A previsão indicava a entrada da frente para o dia seguinte.

Todo mundo pronto e decolamos todos juntos, Enio, Sidney, Bique, Flavinho, Carlinhos, Marcinho, Eu, Lalado, Erick, Cedrick, Rafael, Nader, não sei se esqueci alguém.

Achamos de imediato aquela da direita da rampa, forte, consistente e direto prá cima.

Como num Race to the Goal um grupo partiu zunindo para o buraco da Siméria.

Não fui nessa procurei ganhar mais e partir direto para o Moren.

Foi minha decisão mais acertada do dia.

A pressão suave de SW estava em toda a encosta da Serra dos Orgãos.

Era um passeio de lift e térmicas descolando até a base da núvens, teto na casa dos 2.100m

Este bordo de Petrô até Terê é um dos lugares com visual mais incrível que temos: são paredões, cachoeiras, mata atlântica por baixo e espinhasos de pedra pela frente.

Marcinho partiu antes no mesmo rumo, nos encontramos depois do Moren.

Partimos para o Dedo de Deus que estava estampado na nossa frente.

Vamos fazer a vertical como se fosse um pilão (pensei).

Dito e feito e Teresópolis se descortinou a nossa frente com o destaque para a granja Comari e seu lago no meio da cidade.

Foram visuais incríveis e o Marcinho fotografou alguns que vão aí no anexo.

Erick e Carlinhos tinham visto nossa tirada e seguiram o mesmo rumo.

Depois de balizarmos também o Soberbo seguimos a continuação da cordilheira, agora bem mais baixa e demos uma pequena encalhada procurando aonde encontraríamos novo lift e ele nos alcaçaram.

Viramos um pelotão de 4.

Engano meu.

Como uma flecha Carlinhos chegou, ganhou e passou direto seguindo a cordilheira para o somberado.

O pelotão ficou de 3.

Freio de mão puxado, esperamos num dos picos a chegada da condição que vinha por trás.

Olhamos para a Serra dos Orgão e o teto baixou, escureceu e .....

Xiiiii..., acho que a condição vai ficar feia por lá ....

Acho que não vem mais ninguém nesta rota.

Decisão correta de novo, nasceu novo canhão que nos levou na base de novo.

E, olha lá o Carlinhos, ficou pequininho lá em baixo, foi seguindo para o fundo do vale de Japuíba pela Cordilheira.

Decidimos então evitar este rumo, partindo para cruzar o vale, fugir do sombreado, e chegar na Schincariol.

Fizemos um leque nesta cruzada, um mais perpendicular ao vale os outros mais inclinados e lá fomos nós.

Carlinhos lá no fundo fez o mesmo mas chegou no meio baixo e resolveu vir voltando pelo vale já em nível de procurar pouso.

Cruzamos olhando a condição na frente estabilizada e com poucas possibilidades de acharmos alguma térmica consistente.

No meio do vale estavamos a 900m e L/D para chegar na conta lá na fábrica da Schin, antes de Cachoeiras de Macacu.

Deixamos o Danoninho partir na frente e fomos olhando sua tirada.

Nada, nada, nada,.....

Escolheu o pouso e...

Rodou uma, rodou mais outra....

ACHOU !!!!!

Corremos lá e subimos os três.

Uns 15 a 20 minutos ficamos neste local que estava começando a pipocar.

Cada vez foi ficando mais consistente e tendo como visual que deixamos para trás a formação do CB.

Ganhando e a condição para trás fechando mais.

Mais negro, teto emendando, mas o vento ainda suave e a térmica lisa.

O teto fechou todo.

Em baixo do CB criaram-se varias linhas de onda de vento.

Incrivelmente bonito e tenebroso.

Alguns lugares lá atrás começaram a formar uma cortina d´água.

E estavamos num ponto crucial:

A térmica evoluia, estavamos já a uns 1.400m mas não dava para cruzar o maciço de Macacu.

Depois dele era o único lugar ainda azul.

Voltar para pousar e ver o CB estourar em nossas cabeças era uma das alternativas.

Nenhum de nós três pensou nisso.

Vamos ganhar mais e correr para pular o vale da estrada de Macacu.

Pegar na outra borda e pular para o outro lado, fugindo do CB.

Dito e feito.

Partiu o Danoninho na frente de novo mas ainda sem altura para dar o pulo do gato ou melhor do Dino.

Ganhamos mais e quase na base, com L/D para passar direto, partimos Marcinho e eu.

Danoninho achou de novo do outro lado !

Chegamos uns 500m em cima dele e pinba térmal até a núvem.

E que núvem, era o CB que chegou.

Negro, tenebroso, mas com lindos desenhos de onda de vento em vários tons de cinza por baixo.

Para trás uma cortina dágua e alguns raios começaram a dar sinais de vida lá no vale.

Voltar nem pensar!

Estávamos na borda da frente do CB que vinha, com 2.100m de altura e azul do outro lado.

O negócio era correr para fora do vale.

Uns pingos de chuva começaram a bater na asa e...

Caim, Caim, .....

Três ratos correram do local.

Doninho Erick correu acompanhando um contraforte da montanha em direção a Silva Jardim e pensou que nós tinhamos voltado.

Tadinho, achou que tinha ganho o dia !

Ainda tentou evoluir numa que achou no caminho.

Mas quando o primeiro raio espodiu no maciço que haviamos abandonado ele correu para o pouso.

Não viu que os Dinos tinham partido em outra direção e estavam acompanhando o maciço mirando lá na frente Casemiro de Abreu.

O teto no nosso novo rumo estava uns 500m mais baixo.

Estava escasso com uns poucos e pequenos pompons esfiapados na borda da nova cordilheira que tínhamos pela frente.

Fomos seguindo, paramos ainda nuns 2 ou 3 pequenos picos.

Ganhávamos um pouco até a base mas, nada consistente.

Limpou tudo para frente.

Nenhum sinal de novas ascendentes.

O negócio agora era esticar o L/D.

Puxa a marcha para a melhor posição.

Se estica todo no cinto, até ficar na ponta dos pés.

Escolhe o melhor caminho.

Olha um para o outro para comparar quem esta tirando melhor.

E lá fomos nós 2.

Passamos entre dois picos antes de Aldeia Velha.

Acho que não chegaremos em Casemiro de Abreu se não acharmos nada.

Opâ que vale lindo !

Varios pastos sem fios e com estradinha até o asfalto e sem altura para ir mais....

É aqui mesmo.

Chegamos juntos.

Um num pasto, outro no outro e pouso de quilha.

Acabou a aventura ?

Engano de vocês, aí é que começou a emoção.

O CB continuava vindo no seu caminho.

E estávamos na rota dele.

Era pasto, mas era charco em alguns pontos também.

Corre para desmontar.

Entra o vento.

Segura a asa.

Guarda o cinto.

Pisa na lama.

Liga para avisar o resgate.

Começa a pingar.

Explode um raio no vale atrás.

Corre......

Fecha tudo.

Respinga lama.

Carrega a asa.

Pisa no charco.

Iiii. Tem um riacho na borda da cerca.

Tem que atravesar com a asa nas costas.

Ufa !!!

Cheguei na sombra de uma jaqueira.

Marcinho pega carona com um cara de moto até o asfalto e acha um caminhão no meio do caminho que resolve nos recolher.

Jogamos as asas em cima e os cintos dentro da cabine.

E o temporal desaba em nossa cabeça.

Ensopados, enlameados mas super felizes chegamos no barzinho da beira do asfalto e ....

Vemos o carro de resgate passar direto pela estrada.

O celular já não pega neste local, o rádio acabou a bateria.

O negócio e tomar uma cerva, relaxar e esperar ele voltar.

Cerveja e alegria.

99km.

Pouso em Aldeia Velha - Casemiro de Abreu.

Valeu a todos que voaram.

Os relatos de sufoco de quem ficou no vale de Cachoeiras de Macacu foram de Crachs andando para trás, barras quebradas, choro e reza para descer no meio do CB, raio e fogo no pouso etc...

Mas pela qualidade de todos os pilotos que lá estavam, nada de grave aconteceu somente incidentes.

Valeu o dia.

É mais um para ficar na nossa estória de voadores, malucos e criança grandes e felizes.

Parabéns a todos nós.

Geraldo Nobre

Relato do piloto Geraldo Nobre: São Conrado até Belmiro Braga

Piloto: Geraldo Nobre (piloto de asa, Rio de Janeiro)

Este foi um dos 5 relatos que o piloto Geraldo Nobre (dinossauro do voo com mais de 30 anos de esporte) enviou para concorrer à promoção do Spot com anuidade

Geraldo Nobre: De São Conrado até Belmiro Braga!



Meus Caros Companheiros Alados,

Valeu!!!

Obrigado por tantos elogios, sonhos e dores de cotovelo enviadas.

É gratificante receber tantos incentivos e ver que estou incentivando a todos a voarem cada vez mais e melhor.

Valeu, Nader, Otávio, Glauco, Milton, Valença, Zé Over, Erick, Thiago Salame, Fabiano Ribeiro, Raphael, João Machado, Luisinho e tantos outros que tem o Vôo Livre na veia e que sempre sonham em estar nestes vôos.

Valeu pela companhia de vocês no Vôo Livre e pela amizade embutida nas mensagens.

Agora vamos ao que todo mundo quer saber, o vôo de ontem.

Posso dizer de ante-mão que foi um dos vôos mais complicados de minha vida, principalmente na metade do caminho depois que subi a Serra das Araras.

Ele começou no dia anterior quando, indo a rampa de São Conrado e vendo o Nordestão entrar, limpando o tempo que estava embassado a vários dias, tomei a decisão de não voar e descansar para o dia seguinte quando fatalmente a condição estaria mais redonda e deveria permitir um vôo de XC.

Com Nordestão, se vai ao Cristo, se ganha a Gávea facilmente mas, essencialmente é um vôo onde se briga para descer e não para subir.

E se queria partir para o Cross não era o dia certo e não valia a pena me desgastar.

A decisão foi correta.

5a feira - SEM LEI - amanheceu próximo do perfeito, o teto estava um pouco baixo mas o azul e as formações prometiam.

Parti às 9:00h para São Conrado e a primeira dificuldade do dia apareceu: um baita engarrafamento e mais de 40 minutos da Barra para S.Conrado.

Todo mundo indo para o trabalho e me atrapalhando ir voar já era o suficiente para instigar o nervosismo pelo vôo.

Chego na praia e vejo a turma toda nos agitos de subir.

Todo mundo percebeu que o dia era bom e chutamos o balde do trabalho como um bando de aves que parte para o Sul.

Para melhorar, reunião na AVLRJ e rampa fechada para os duplos.

Que perfeição, 20 asas top de linha alinhadas para partirmos.

10:40h - Saquarema abre os trabalhos, decola, engata, vai para o rotor e estampa no céu.

É o corre corre geral.

- `Vambora` que a farofa começou.

A maldade de fazer uma distância para fora de S.Conrado e ganhar alguns pontinhos a mais no XC Rio estava estampada na cara de quase todos.

Dinos, Danoninhos e Dentes de Leite planejando a fuga em massa de São Conrado.

Táticas e técnicas que estavam na cabeça de cada um apareciam nas faces dos degladiadores do dia.

Partimos.......

Um batalhão desesperado para chegar no Cristo.

No rotor, um canhão redondo que já levava a mais de 1.000m.

Alguns foram para o Croc, contorna-lo, e a maioria já partiu direto por dentro do alto da boa vista para o queimadinho, tamanha era a certeza da boa condição.

Chegamos nas antenas e boom outro pontapé para cima.

- Ainda não esta redondo, vamos mais para frente;

Na torre de alta tensão antes da última cruzada para o Cristo outro pontapé prá lua;

- Vamos, vamos, na frente tá melhor;

E o Sadia que estava puxando o trem chegou no Cristo e catapum, subiu que nem foguete.

- Pica, anda, sai do buraco que a de lá é a melhor do pedaço !!!

E era, um canhão redondo que levava a mais de 1.200m e permitia curtir o visual do Rio de Janeiro inteiro.

Olhava prá trás e lá vinha uma fila de ferozes caças ninja na direção da termal que pegamos.

Cada um que chegava, engatava e estampava.

Prá galera que estava no Corcovado deveriamos parecer um bando de mosquitinhos infernizando a vida do Senhor de Braços Abertos.

- E agora ?

Bom, a tática inicial de todos estava cumprida.

Ir ao Cristo antes da tirada para acumular uns pontos e esperar a condição arredondar.

Ainda não era hora de partir para o Cross, tinha que esperar a condição formar no caminho.

Voltei para as antenas e vamos cozinhar o galo um pouco para ver qual o melhor caminho para o pico.

E qual não foi a minha surpresa quando a galera continuou sem parar e zoom voltaram para a concha de São Conrado e alguns já jogaram para o pico do Papagaio e partiram.

- Xiiiii....

- Acho que fiquei prá trás !

- Mas, tá muito cedo !

A tirada direto das antenas para o Pico da Tijuca está com uma descendente só e chegar lá baixo é um tiro no escuro.

Teto de 1.200m é bom para o vôo local mas para tirar ainda é baixo.

Vamos voltar para aquela térmica do rotor e corujar como está a condição lá no Pico do Papagaio.

Engatado na núvem em cima do Croc fui derivando para o Alto da Boa Vista e vendo alguns ralando na cordilheira do Pico e outros já indo embora.

- Este teto tá baixo !

- Com 1.200m não dá para cruzar para a Pedra Branca e engatar na condição de lá.

- Tenho que arrumar outra saída.

Tô chegando na região do Pico e encontro o Carlos Augusto e o Giovanni batalhando por lá.

Procura, cata, e acha o miolo que estava bem no meio da Floresta da Tijuca.

E lá vamos nós, núvem.

- Agora é nossa vez de tirarmos !

- Nada de proa Jacarepaguá que vai pousar lá pelo Rio 2.

Então, proa Campo dos Afonsos, ciscando na região do pedágio da Linha Amarela que o vento de Nordeste mostrava uma formação por lá.

Olho para trás e arrumei um fiel escudeiro.

Giovanni partiu na minha cola.

- Beleza, em dupla é melhor para ciscar e tem o conforto da companhia em vôo.

Dito e feito, chegamos perto do pedágio e boom....., um canhão forte e redondo nos leva de volta à núvem.

Emburacados miramos o Campo dos Afonsos e o pouso por lá ou pelo outro lado da Av.Brasil, no campo de polo, já estava mais do que garantido.

Seguimos e só cidade em baixo .............. e nada de achar a seguinte.

Passamos por Bangú e nada.

- Acho que vamos merrecar por aqui, pensei.

Meu escudeiro vai mais para cima da cidade e eu mais para o gericinó.

Ele achou os pipocos de uma salvadora.

Juntamos e a térmica falhada corria de Nordeste.

Era derivar com ela ou procurar pouso.

Meu amigo não teve a paciência necessária, correu mais para a frente e garantiu o pouso no Aeroclube de Bangú.

Minha insistência me levou a engatar redondo em cima do pouso dele e pegar a condição da Serra do Vulcão por trás.

Segui subindo e derivando até quase o Pico do Marapicu.

Emburacado de novo, partir para dentro da região do vôo de N.Iguaçú.

Tomando como proa Japeri, onde as formações no caminho me mostravam vários cúmulus.

Ir para Seropédica também teria sido uma boa Opção.

Ali o vôo é tranquilo.

Grande pastos, áreas planas e térmicas redondas apesar de intensidade fraca e teimando em permacer em torno dos 1.200 a 1.300m o que é muito baixo para a região.

Mas, relaxei e procurei curtir o vôo e chegar na próxima, que estava perto da Via Dutra, depois de Queimados.

Engatei, subindo, falhado e decidi seguir para a próxima.

Boa decisão engatei melhor e núvem de novo.

Japeri cresceu na minha frente e parecia a melhor direção.

Passei pela cidade e corri para a região da rampa de lá.

Cheguei estava fraco e a minha altura era de quem tinha acabado de decolar e ganhado um pouco.

- É...., pensei, estou decolando de Japeri para fazer um vôo.

- São 13:00h e o meu vôo está começando agora.

- Vamos ficar na pedreira e esperar a condição chegar aqui.

Esperei a núvem chegar perto e engatei no canhão.

1.400m !

E agora a decisão: volto para N.Iguaçú que o caminho está bom ou tento seguir para o meio do nada nas montanhas ?

- Teto baixo....... e você já voou ali........ a região é só de morrinhos, florestas, rotor e cruel de pousos..............

- Volta que o vôo vai ser mais visual e mais tranquilo.

- Que nada, vamos lá que a formação tá bonita.

Engatado no teto passo de Japeri para Paracambi e parto na direção entre Barra do Piraí e Valença.

A coceira do Cross fala mais alto que a sensatez.

A faixa de vôo encolhe, o teto de 1.300 a 1.400m e o piso sobe pelo menos 600m, com morrinhos a 800m.

Sobram poucos metros para as tiradas.

Não podem ser longas, tenho que partir direto para a mais perto e engatar senão é chão.

Chapar no meio dos morrinhos do planalto de Paulo de Frontim não é nada agradável.

Com as pernas tremendo chego na próxima já naquela de olhar o melhor morrinho para chapar.

Mas, ufa, sinto a térmica cisalhada pipocar e engato derivando para sair da primeira roubada.

- Pronto a pior parte já passou.....

Olho para frente e que nada, teto baixo e mais morrinhos mas, pelo menos tem formações ao alcançe.

Cruzo para a serrinha e engato na condição de novo.

Agora outra decisão crucial.

O vento está acompanhando um pouco o relevo mais para Sudeste em baixo e mais Nordeste em cima.

Sigo no Nordeste ?

Acho que não, a possibilidade de alcançar a próxima se mudar a rota uns 45º vai melhorar.

- É isso aí, tem umas formações lá na frente, depois do rio.

- E dá prá chegar lá.

Sai da linha de sustentação e para a cruzada só pego pequenos rotores e vento de través.

Cruzo o rio, chego no que parecia bom e a formação já tinha passado.

Corro a pequena cordilheira, olho para os pastos lá no final e ....

- Vamos é esticar o L/D para chegar no pasto perto da estrada.

Pri...Pri....

Sobe, desce, abre o cinto....

Calcula a aproximação para o pasto mais próximo.

- Mas, vamos insistir.

- Se não ganhar pouso aqui mesmo.

- Ando mais mas, vale a pena tentar.

- A falhada tá forte.

E, tchan, tchan, tchan....

Nasce o caroço.....

- Agora não largo ela mais mais.

- Fecha o cinto....

Derivo para dentro das montanhas mas subo com tudo...

- ÔOoooooba !!!

- Tô voltando pró vôo.

- E daqui prá frente tá formando um cloud street.

- Capricha, arredonda.

- Paciência, espera chegar na núvem.

- Que nada, ele tá logo ali no próximo contra-forte.

- Tirei....

- IIIIIIiiiiiii, acho que devia ter ficado mais, vou chegar lá no limite.

- Cheguei.

- Nãooooooo, ela não tá aqui.

- Tá lá no fundo daquele vale, sem pouso, só chapadas.

Na batida do vôo, de sangue quente, sigo em frente.

Chego no fundo do vale no limite da altura.

Não dá prá pular o morro.

Cisco e nada.

Porrada prá cá, porrada prá lá e .....

- Porra, seu babaca, você tá no pé do cloud street e jogou o vôo fora....

- Caral...o, endureceu e despencou da falhada.

- Qual o menos pior morrinho da rotorzeira deste valezinho estreito e safado ?

Tome porrada.....

- Contorna a pedra da direita, volta e pica para chapar de volta naquele meio pasto, pensei....

Fui e priii..iiiii...iiiii

-Voltaaaaaaaaa.

Priiii.iiiii..iiiii

- Enroscaaaaaaa..

- Força nos braços seus babaca.

- Beleza, engatei forte.

- Não relaxa não.....

- ah.ahah.ah..ah.aa.a.a....., lá vou eu de novo.

Começo a ganhar a serra e atrás do morro aparece a cidade de Valença.

- Ufa!!!!

- Aprendeu seu trouxa!

- A térmica tá boa mas o teto tá baixo.

- Tem que ganhar bem e tirar para a mais próxima com certeza de chegar.

- Ok, ok, ok....

- Relaxa, tô ganhadão e olha o cloud street na frente.

- Vamos lá que agora é só alegria.

Aí o vôo virou alegria um cloud que me fez andar bem, passar por Rio das Flores e continuar navegando pela pequena cordilheira abaixo.

Chego no final e parto para a esquerda para novas montanhas ou vou naquela lá na frente na curva do rio com a montanha do meio.

Vamos lá naquela que tem um pasto enorrrrrrmmeeee na beira do rio e um povoado do lado.

- Beleza, que visual ....

- Tô no meio do mundo, sozinho e estampadão no céu...........

Vou seguindo tranquilo, tranquilo e chego na formação na média altura e o vario começa a cantar de novo.

Arredondo.

Térmica suave e ...

- Rapaz agora que saí da roubada e que aparecem estes urubús para azarar a minha térmica.

- Sai daí neguinho.......

- É, tá bonito mas tá acabando.

- Olha o buraco azul prá frente.

- A próxima formação tá lá prá Juiz de Fora.

- Não dá prá chegar.

- Só se engatar naqueles pedrocos no meio do caminho.

- É, mas eles já estão esfarelados.

- Mas é o caminho mais seguro para este final de vôo.

- IIIIiiiii, não vai dar prá chegar encima deles.

- Vamos entrar pelo vale a dentro, ciscar lá e voltar para aqueles maravilhosos pastos lá no fundo...

No meio do vale aquela de final de tarde, fraca, suave e que também não rende muito.

Ganho o suficiente para olhar para o outro lado e penso vamos esticar por cima na direção daquela cidadezinha (Belmiro Braga).

Outra decisão meio tola.

Chego na montanha no limite.

Cruzo e caio no rotor.

Cruzo rente por umas florestinhas e quando de repente atrás do morro aparece, imaginem, um imenso campo de polo, isto mesmo, polo, todo plano com a grama recém aparada.

- Chega, é aqui mesmo.

Aproximo.

Entro picado e como ele estava no rotor, catabummm

Um sonoro chrash para encerrar a aventura.

O gerente da fazenda e dois ajudantes estavam ali e incrédulos não sabiam o que dizer ainda mais quando disse que vinha de São Conrado !

Fazenda Paraíso !

Para surpresa minha, de Armando Klabin, tio do nosso saudoso amigo Maurício Klabin.

Desmonto a asa e vamos prá cidade esperar o resgate que chega às 22:00h.

Antes ligo para os amigos e o alvoroço na praia e na internet vocês já sabem.

Brigaduuuuuu......

Geraldo Nobre

Relato do piloto Geraldo Nobre: Terça-Feira GORDA!

Piloto: Geraldo Nobre (piloto de asa, Rio de Janeiro)

Este foi um dos 5 relatos que o piloto Geraldo Nobre (dinossauro do voo com mais de 30 anos de esporte) enviou para concorrer à promoção do Spot com anuidade

Geraldo Nobre:

Terça-Feira GORDA!


Terça-feira !

Dia que foi feito para todo mundo trabalhar.

- É..........

- Mas como é que está a condição ?

Abro a janela e.......

Oestão rasgando, teto azul, sem núvens e um cirrus se dissipando no céu.

- É.......

- Mas hoje não tem vôo em São Conrado........

Às 7:00h ligo o computador e imediatamente recebo um e-mail do Valença:

- Tá pronto ?

Um susto e ??????????

Ligo o celular e chega um torpedo dele também:

- Vambora ?

Outro susto e ??????????

5 minutos depois toca o celular.

- Tô saindo, vamos para Petrô; tive bons pressentimentos e hoje é o dia.......

Assim não há quem resista.......

Que trabalho que nada.

Praticamos um esporte que depende da natureza e é ela quem manda.

Tá dando vôo, vambora......

Lá fomos nós !

Já no carro ele trata de botar pilha na galera:

Liga para o Erick e grava na secretária eletrônica:

- Estamos tendo uma invasão de naves alienígenas nuvolentas.

- Vai deixar a gente ir sozinho prá Petrô ?

Liga para o Giovanni e manda ele largar o trabalho e partir para a rampa se não ele vai arrepiar nos pontos.

O Glauco liga para comentar da mega condição que está se formando e não acredita que já estamos na estrada........

Fica na pilha, desesperado, pois tem uma aula para dar na parte da tarde e não vai poder faltar.

Chegamos na rampa, o ventinho está perfeito de frente.

- Vamos montar antes da condição chegar......

As núvens vinham se formando da baixada para a serra.

Cada vez mais perto.

Perfeito.

Os pobres coitados que o Valença conseguiu arruinar o dia de trabalho também chegam.

Erick, Cedrick, Papito, Giovanni e Fabiano.

Como eu, também não resistiram e abandonaram tudo para ir voar.

11:45h decola o Erick e a primeira mensagem dele no rádio foi:

- Caraca tá subindo tudo !

- 5,3m/s

- Tá bom ou quer mais ?

Não há como esperar mais.....

Decola todo mundo e tacapum prá cima.

3, 4, 5 enrocasdas perfeitas e todos estampam no céu.

A galera do parapa que tinha chegado fica olhando, vendo os pontinhos velozes no céu e pensando:

- Será que dá prá gente decolar também ou tá forte ?

Enquanto eles pensam o Destemido Erick parte com tudo prá frente do Cristinho.

Foi, foi, foi, continuou fo..indo e descendo.

- ihihihihihiihi......

- Tá subindo tudo mas, tá frio, é cedo, e as descendentes tão consistentes.

- Tem que ter cuidado para não cair antes da hora.....

Valença estampa na rampa e segue prá lá também mas, ao contrário do Erick só vai na boa e estampadão.

Eu e Cedrick passeamos um pouco para o lado direito da rampa (para acumular km/pontos malandramente) e quando voltamos a da rampa já não tinha mais.

Seguimos para o Cristinho também e achamos de novo o canhão.

Primeiro falhado, depois um pontapé prá lua.

- A rota é pela encosta, pensei.....

- Tá frio, com sombras e acho que teremos poucas térmicas no meião.

- O negócio e boiar pela encosta.

Parto junto com o Cedrick na direção da Siméria e do Moren.

- Olha lá.....!!!!!!

- O Érick já se recuperou no morro do avião e já tá na nossa frente lá no paredão do Moren !!!!!!!

Chegamos no paredão do Moren e logo descobrimos que canhão....... já era........

Tem "lift" mas tá fraco e só é consistente quando a formação tá chegando na encosta.

O negócio é aproveitar o que tem e curtir o visual da floresta, dos paredões de pedra e da cachoeira que está na nossa frente.

Vamos boiando de pico em pico.

Enroscando na base da formação e aproveitando ao máximo a "chupada" das núvens.

Logo, logo descubro que arrumei um sombra.

Cedrick jogou a marimba e se amarrou na minha quilha.

O Erick dispara no rádio.

- Vou abrir para o meião que aqui tá fraco e tá ficando pesado.

- Vai não que é furada, pensei.... mas ele foi tão decisivo que respeitei sua opinião e não falei nada.

Puxei o Cedrick comigo na direção de Teresópolis.

Avistei o Dedo de Deus e cravei a rota na sua direção.

Passamos bem ao lado dele, com o visual da Granja Comari no meio de Teresópolis.

I N C R Í V E L, a vista e a sensação de passar ao largo deste cartão postal.

- Vamos seguir em frente e cruzar a garganta do soberbo para pegar o "lift" do outro lado.

- Vambora Danoninho Sombra......

E ele não decepcionou, lá fomos nós.

Cruzamos, enroscamos, lifitamos e seguimos nas fraquinhas.

No contra-forte da frente vai esta melhor.

Conforme previsto:

Chegamos lá e a condição também.

Arredondou e lá fomos nós encostar no teto de núvens.

Giovanni que vinha na cola, uma termal atrás, resolveu abrir para a Parada Modelo e foi caindo, caindo, caindo....

- Lá se foi mais um pro chão.....

- O jeito e continuar pela cordilheira até o fundo do vale.

- Vambora de novo...

E de pico em pico chegamos no fundo do vale, aonde já havia pousado uma vez.

- Pronto, agora é cruzar os morrotes da fente e chegaremos em Conceição de Macacú.

- Naquelas cordilheiras antes da cidade eu sei que tem..........

Como burro puxando a carroça, lá fui eu.

Tirada longa mas lisa e com pouca perda.

Chegamos a média altura e foi novamente junto com a formação que chegava.

Que sensação maravilhosa, aquela de enroscar redondo numa termal consistente até a base das núvens e isto há mais de 60km da decolagem.

- É, mas o teto tá baixo.....

- A serra depois de Macacu é alta e vai ser complicado pular.

- O jeito é dar um pulo de cada vez, não vai dar para passar direto como das outras vezes.

- Vamos cruzar o vale onde está a cidade e pegar nos morrotes antes da cordilheira, foram os meus pensamentos.

- Vamos...., apitei e botei lenha na caldeira do trem...

A cruzada foi firme e tivemos que acelerar um pouco, pegamos a descendente de uma formação que estava mais a direita e na frente do vento.

- Força, força, tem que passar o primeiro morro e pegar naquela concha onde as bananeiras estão encabeladas pelo vento.

- É alí.......

- E o Danoninho não veio ????

- Voltou da borda da pulada ????

- Que que houve ?

- É alí....

Pôu....

Catapum....

Duas ou três falhadas e canhão prá cima....

Derivando para as montanhas e subindo......

- É o passaporte para a cruzada da serra.

- O próximo vale é tranquilo de cruzar pois, ele é todo de aclive com o vento subindo e na próxima encosta tem uma acendente residente de nota 10.

- CADÊ ELE ?

- Ele voltou ?

- Não acredito....

- Será que ele vai tentar pegar aquela formação que vem com o vento ?

- Não, não pegou...

- Vem de lá Erick, o Cedrick tá pousando naqueles gramados antes de Cachoeiro de Macacú...

- OK ???

-rschshichsie.......

- Recebido.

É agora é só comigo.

Vamos continuar a jornada que está cruzada é de um visual alucinante.

Como era esperado, encostei na serra e o vario apitou redondo, constante até a base da núvem.

- 1500m já estou no teto e o visual de todo o caminho percorrido e o vale formado pela concha das serras de Tanguá, Cachoeiro, Friburbo e Teresópolis estava atrás de mim.

Baixo para a região mas o suficiente para cruzar para o lado de Silva Jardim e Conceição de Macacú.

Agora é chegada a hora daquela parte chata da tremedeira em vôo.

Tremedeira de porradaria da condição de rotor que está por vir e tremedeira de medo da pancadaria.

Temos altura suficiente mas, vem uma região de varios morrotes, longe da BR-101 e no rotor desta "porra" desta serra de Friburgo que ainda não consegui botar mais de 2.200m nela para passar por cima.

- Vou cair no rotor de novo......

- Mas o que fazer ?

- Voltar ?

- Jamais.

Respiro fundo, travo a barra no peito e parto.

No começo, na saída da base da núvem e ainda alto, tudo bem.

Começo a perder altura e a chocolateira começa.

Rotor de um morro.

Vento do outro.

- Tem que abrir mais para o meio para pegar o vento e depois voltar de cauda para os morrotes.

- Vai .....

- Pica....

- É, fui, piquei mas a altura toda foi pro saco...

- Saí dos rotores, cheguei nos pastos mais afastados, peguei o vento de cauda, peguei o primeiro lift, segui para o segundo e uns 15 km depois estava B A I X O.......

- 300m a 400m mais ou menos.

Sem sol, formação pesada, só me restava liftar no morrote e mirar o pasto mais próximo.

- 85 km já tá bom.

Vamos fazer uma permanênciazinha para relaxar e depois pousar naquela fazendinha alí.

Tem estrada até a BR e eu já conheço o pessoal pois já pousei alí também.

Aí o vento começa a aumentar.

Solto a asa e literalmente imito um gavião parado no vento.

Ôpa, tá subindo.

Dá um bordo prá cá, outro prá lá.

Encaixa numa termal saido do pasto e derivo com ela.

Ganhei, derivei mas caí dela.

Ainda tava falhada.

Volto, apanhando pelo rotor do morrote e começo de novo.

Abro mais para frente pois vejo um urubú começar a subir que nem elevador.

E..........

Lá vou eu.....

Agora ela ficou grande redonda e devivando na rota que eu quero.

Começar de novo........

10km andados nesta brincadeira de subir e derivar nesta térmica.

O suficiente para pular o próximo vale e chegar na próxima encosta.

Repito a dose e tô vendo Cachoeiro de Macacú ao alcançe de meu L/D.

Mas como a ganância e a esperança de achar outra é maior, em vez de abrir para o baixio, volto o bico da asa para os vales de dentro e parto.

Altura não ganhei mais mas, em compensação, passei por trás de um pico maior e caí no rotor dele, num pequeno vale estreiro e ....

Tome PORRADA do rotor ......

- É para aprender mais uma vez que não se joga por trás de um pico em um vale no través do vento.

Mas, como tinha altura suficiente, cruzei toda a rotorzeira e ainda passei por trás de outro morro tomando mais cacete para chegar num vale onde os urubús ainda lifitavam.

Já tinha consciencia que estava no fim do vôo.

110km, 4:00h da tarde, céu encoberto, núvens acachapadas e sem força e um vento consistente de través.

O negócio agora era sair do meio dos morrotes e escolher um bom pasto para pousar.

Sobrevoei a entrada do vale em que estava (com arados em baixo), olhei para a frente para a BR-101 que estava ao meu alcançe e decidi.

- Aquele pasto, sem obstáculos, sem postes, sem rotor, na beira da estrada e em frente aquele posto de gasolina é perfeito para terminar o vôo sem sustos.

Aproximei perfeito.

Rodei em cima do pasto, dei o último bordo transversal ao vento, em cima da BR e cravei a quilha no meio de um grande gramado.

3:56h de vôo e 112km de Petrô.

Compromissos chutados para o alto;

Alma lavada pelo vôo;

Esperança que amanhã tenha mais;

Terminei meu dia no resgate trocando máximas de vôo com meu parceiro de aventuras e aprendiz de Dino, Valença.

É não foi uma terça-feira normal de trabalho, foi uma TERÇA-FEIRA GORDA !

Obrigado a todos que dela participaram,

Geraldo Nobre